segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O CONFRONTO

A noite parecia calma, como sempre.

Estava conversando com meu parceiro sobre alguma coisa, que agora não consigo me lembrar.

Viramos a esquina.

E foi ai que escutei uma pancada seca contra a lataria da viatura.

Pensei “só me faltava essa”. Mas, depois do segundo “pipoco” não tive duvida. Estavam atirando na gente.

Na hora não da pra pensar em muita coisa.

Lembro-me somente de ver o pára-brisa estourando, e em seguida meu parceiro reclamando de dores no ombro esquerdo.

No entanto, não dava pra saber se era alguma coisa relacionada com o vidro que havia estourado com segundo tiro, ou se ele tinha sido atingido.

Saquei minha pistola e atirei na direção da onde vinham os tiros...

Disparei seis vezes. Depois escutei um grito.

Perguntei como estava meu parceiro, e ele me disse que estava bem. Então pedi para que solicitasse o apoio de outras viaturas.

Aproximei-me com calma. A arma apontada na direção da onde tinha vindo os disparos. O coração a mil.

De repente, vi uma coisa que sei nunca vou esquecer.

Um garoto de mais ou menos 17 anos estava caído na minha frente. Esvaindo-se em sangue, e dando seus últimos suspiros antes de morrer.

E foi então que entrei em desespero.

Não pelo que tinha feito. Pois estava amparado, agira em legítima defesa.

Mas por ver alguém tão jovem, alguém que havia conhecido, alguém que acreditei que teria um futuro pela frente. Que acabou escolhendo a vida do crime, porque achava que seria alguém, mesmo que fosse para ser um criminoso.

E agora estava ali, um corpo caído no meio da rua, sem vida, mais uma vida ceifada tão cedo e de uma forma tão estúpida.

Depois disso, passaram-se muitas outras noites.

E sempre que passo por aquela rua, lembro-me do dia que fui obrigado a tirar a vida de outro ser humano.

Não somente pelo jovem que morreu naquela noite, mas porque naquela noite uma parte de mim morreu com ele.

Osvaldo Zuim Junior
Guarda Municipal de Jundiaí






ANJOS DA NOITE

À medida que a noite vai caindo um a um eles vão chegando.

São homens comuns. Pessoas que na maioria das vezes passam despercebidos no meio da multidão.

Vários deles, aparentando ter mais idade do que realmente tem.

Isto por causa de um corpo castigado pelo tempo, e um rosto marcado por noites e mais noites, cuidando dos locais que pertencem ao povo, ou patrulhando as ruas da nossa cidade.

Todos têm alguma história triste para contar.

Depois de uniformizados e armados, eles começam mais uma noite de trabalho.

Perguntar quantas noites foram passadas como esta, é perda tempo, a muito já perderam a conta.

Eles conhecem a cidade como ninguém conhece. Mas é como se estivessem em outro lugar, outra cidade.

Os pontos de referência não são somente compostos de ruas ou praças. São todos os lugares onde exista algum tipo de perigo.

Ruas mal iluminadas, becos escuros, favelas, locais onde às vezes aparecem corpos de infelizes que foram assassinados e depois ali jogados, como se nada fossem.

Apesar de tudo, eles estão lá. Velando sempre, pelo sono daqueles que muitas vezes os criticam. Chegando a dizer que não são necessários.

Desperdício de dinheiro é o que dizem...

Até o dia que o perigo ronda a porta.

Um barulho. Um vulto. O coração batendo forte.

Desesperado alguém liga, e lá estão eles. Tão rápido como se não existissem. Como se fossem fantasmas. Algo que somente é possível para aqueles que conhecem a cidade como somente eles conhecem.

Mesmo no meio do caos, gentilmente se aproximam, e atendem aos que clamam por sua presença como se fossem irmãos seus.

E após amparar aos que precisam, após cumprir sua obrigação, eles seguem. Como anjos, anjos de azul, ou melhor, anjos da noite.

Osvaldo Zuim Junior
Guarda Municipal de Jundiaí